quarta-feira, 26 de fevereiro de 2014

O racismo brasileiro de cada dia

Artigo publicado no jornal Tribuna de Minas, na edição de domingo, 09/03/14.

Por mais que as estatísticas provem o contrário, o discurso da inexistência de racismo no Brasil ainda é sustentado por pseudointelectuais. Até mesmo na Justiça arrumaram um jeito de esconder essa modalidade de crime, criando a chamada "injúria racial".

Nesta semana, mais dois casos de racismo vieram à tona na mídia e principalmente nas redes sociais. O primeiro trata-se da prisão injusta do ator e psicólogo Vinicius Romão, que foi acusado de ter agredido e assaltado uma mulher no Méier, Zona Norte do Rio. O outro foi a fala de
 uma participante do Big Brother Brasil, de que se não usasse desodorante ficaria com "cheiro de neguinha".

No caso do ator, a polícia mandou-o para cadeia sem encontrar nenhum objeto do roubo sob sua posse. O único critério utilizado foi o reconhecimento feito pela vítima, certamente nervosa. Como Vinicius é negro e estava nas proximidades do crime, o que mais precisava ser contestado? Quiseram poupar tempo, pois a cor já dizia tudo, né?

É impressionante como até nos dias atuais "todo camburão tem um pouco de navio negreiro". Abordagens, prisões e execuções sumárias de negros por parte da polícia são mais comuns do que se imagina. Não faz muito tempo que a imprensa divulgou uma ordem de serviço da PM paulista, onde o comandante de um batalhão em Campinas pedia abordagem "especialmente para indivíduos de cor parda e negra."

Passando para a questão do que foi dito no Big Brother Brasil, é interessante ver que a Rede Globo simplesmente levou a cena ao ar, mas sequer se preocupou em repudiar o ato. Ao dizer que a falta de desodorante a deixava com "cheiro de neguinha", Franciele usou o canal para a propagação de ideias racistas, cometeu crime. Mas para a emissora, foi apenas mais um episódio daquele reality show de horrores.

O pior de tudo é saber que essa ofensa vai ficar por isso mesmo. Pois a mesma Justiça que se apressa em mandar um negro inocente para a cadeia é aquela que tem tolerância com o racismo, e não leva a sério nem mesmo o eufemismo da "injúria racial".

domingo, 29 de dezembro de 2013

Uma cidade sangrenta

Nunca se matou tanto em Juiz de Fora

Com 138 homicídios registrados até a última quinta-feira, 2013 vai chegando ao fim como o ano mais sangrento da história de Juiz de Fora. Até então, o posto era ocupado pelo ano de 2012, quando 99 pessoas foram mortas na cidade.

A escalada da violência no município denuncia uma enorme fragilidade nas políticas de segurança de Minas Gerais, e mostra que o poder público precisa agir rápido se ainda tiver pretensões de vencer a guerra contra a criminalidade.

Talvez, o primeiro passo seja reconhecer que estamos em uma situação ruim. Já virou moda as autoridades dizerem que “aqui ainda está bom”, porque nossos índices de mortes violentas são menores do que tal cidade de porte semelhante.
 Quer dizer que se a grama no jardim do vizinho está maior, a do nosso quintal também pode continuar crescendo? Errado. Cada um que cuide para melhorar o espaço sob sua jurisdição.

Outra medida importante seria a construção de um banco de dados com o real número da violência, livre dos maquiamentos por interesses políticos. Não tem lógica alguma excluir uma vítima de assassinato das estatísticas só porque ela faleceu no hospital, e não no local do crime em si.

É preciso que o Estado desenvolva um trabalho sério para preservação da vida em Juiz de Fora.  Além do combate ao tráfico de drogas e porte ilegal de armas com maior estruturação e preparo das polícias, a cidade também precisa de programas sociais para o enfrentamento da questão.

O que a Prefeitura oferece hoje para tirar os jovens e adolescentes da ociosidade e, consequentemente, do submundo do crime?

É impossível se conformar com o atual quadro de insegurança que vem se instalando em nossos bairros, praças, ruas e avenidas. Independente da índole de quem morre, cada baixa é uma grande derrota para o município.

domingo, 27 de outubro de 2013

Polícia para menores, pretos e pobres

Circula pelo Facebook um manifesto elitista e preconceituoso em favor da redução da maioridade penal. O chargista desconhecido (talvez porque tenha vergonha de assumir publicamente seu ódio contra negros e pobres) resolveu deixar sua provocação.
Charge de cunho racista retirada do Facebook

A charge traz um diálogo conflituoso entre uma mulher negra e um policial militar dentro da favela. A mulher negra é mãe de um bandido menor de idade que o policial (herói) havia acabado de matar, e esse adolescente favelado, com apenas 15 anos, "já tinha matado 3 pais de família".

O que me incomoda na charge não é o clamor pela redução da maioridade penal, mas a forma que o chargista escolheu para pedi-la. Uma coisa é protestar contra a tolerância da legislação brasileira no que diz respeito aos crimes praticados por menores, outra coisa é criminalizar os negros e pobres de forma geral.

Fica claro o racismo do chargista em sua arte. É como se não existissem menores criminosos com outra cor de pele, ou morando em condomínios de luxo também. Chego a desconfiar do real interesse deste manifesto.

quarta-feira, 28 de agosto de 2013

Os 50 anos do sonho de Martin Luther King


Há cinco décadas, em 28 de agosto de 1963, o pastor Martin Luther King subia as escadarias do Lincoln Memorial, em Washington, para proferir o histórico discurso 
“I Have a Dream”. Aquele era mais um capítulo da intensa luta pelos direitos civis dos negros norte-americanos num período de grande segregação racial.

Os negros eram vistos como cidadãos de segunda classe nos Estados Unidos, e por isso não podiam frequentar os mesmos ambientes que os cidadãos brancos. Também não tinham direito ao voto, e estavam entregues a violência e ao desemprego, principalmente no Sul do País.

Neste contexto social, Luther King liderou a conhecida “Marcha Para Washington por Empregos e Liberdade”, onde pregou uma reação não violenta contra a opressão do racismo. Diante de uma multidão de pessoas, disse que sonhava com uma nação onde seus filhos não mais seriam julgados pela cor da pele.

Infelizmente o líder não teve tempo de contemplar a realização deste sonho. Mesmo pregando a mudança por meio da paz, foi assassinado em abril de1968. Ao invés de intimidar os que clamavam por igualdade, sua morte só fez aumentar os protestos. Hoje, apesar de ainda haver certas diferenças a serem corrigidas, os afro-americanos já conquistaram grande parte dos direitos reivindicados nos anos 60.

Quarenta e cinco anos após o famoso discurso "Eu tenho um sonho", os eleitores americanos elegeram Barack Obama como o primeiro presidente negro da história dos Estados Unidos, não deixando nenhuma dúvida de que a semente plantada por Martin Luther King havia florescido.

Certamente a luta dos negros norte-americanos influenciou no combate ao racismo pelo resto do mundo. É impossível não ver um traço de King em Nelson Mandela durante a batalha contra o Apartheid, na África do Sul.

Até mesmo no Brasil, onde ainda há muito o que ser feito contra as diferenças raciais, Martin Luther King conseguiu deixar seu legado.

sexta-feira, 19 de julho de 2013

Princípio de incêndio atinge bar em Juiz de Fora

Flagrante:

Um princípio de incêndio foi registrado hoje a noite no Bar do Edinho, ao lado da sede da Astransp, no bairro Poço Rico. O fogo se iniciou por volta das 18h, na churrasqueira do estabelecimento, assustando os clientes que consumiam no local. 
As chamas chegaram a atingir o teto, mas foram controladas com um extintor pelo proprietário do bar. Ninguém se feriu, e os bombeiros não foram acionados. 
                                                  
Imagens exclusivas: Wilian César

domingo, 12 de maio de 2013

A publicidade da exclusão: cadê as mães negras?

Em homenagem ao Dia das Mães 2013, as "Casas Bahia" (maior anunciante do país) fez um comercial bem inteligente para comemorar a data. Ao som da música "Fico assim sem você", interpretada por crianças, um vídeo vai apresentando diversos momentos em que as mães estão presentes na vida dos filhos, sempre com muito carinho e (dedicação).  Numa forma de referência ao tradicional slogan "Dedicação total a você".

Do ponto de vista da emoção e criatividade, podemos dizer que tal comercial é uma obra perfeita. Porém, observando com um olhar mais crítico, é impossível não se atentar para um velho problema da publicidade brasileira: a resistência em colocar personagens negros nos papéis de destaque das campanhas publicitárias.

Se é para homenagear a "dedicação de todas as mães", como é dito por uma voz feminina ao final da mensagem, porque não existem mães e filhos negros nesse comercial das Casas Bahia então? O interessante é que a própria "Casas Bahia" tem uma expressiva quantidade de clientes negros.

A impressão que fica é que as mães negras não possuem uma relação de carinho e "dedicação" com seus filhos, ou que elas nem mesmo existem no Brasil. É uma exclusão semelhante a que acontece nos programas de televisão (principalmente novelas).

Ninguém está pedindo aqui uma cota para negros em campanhas publicitárias e nem acusando a loja de racismo, mas é importante lembrar que nós, afrodescendentes, também consumimos bens e serviços.

Não sei se a falha é das "Casas Bahia" em si, ou da agência de publicidade responsável por suas campanhas, a Young & Rubicam, de Roberto Justus. De qualquer forma, fica a crítica.

Assista o comercial do Dia das Mães 2013 Casas Bahia:

segunda-feira, 25 de março de 2013

"PEC das Domésticas" o pesadelo da elite

A aprovação da "PEC das Domésticas" no Senado foi recebida com indignação por muitos patrões brasileiros, basta observar alguns comentários na internet para perceber o clima de insatisfação entre eles.

Em uma das opiniões mais absurdas que li na rede, alguém  classificava como "injustiça" o fato de uma doméstica "que não estudou" receber acima de R$ 1 mil, como se todas as domésticas fossem analfabetas e, o estudo, único critério de valoração de salário.

De acordo com outro internauta, a categoria não pode ter tantos benefícios porque, diferente dos demais trabalhadores, "não gera lucros" para o empregador.  Quer dizer então que roupa lavada e passada, refeições e, casa arrumada, não são lucros? Enquanto os patrões ganham dinheiro na profissão que exercem, quem garante o conforto do final de expediente?

É de conhecimento público que o emprego doméstico no Brasil surgiu com o fim da escravidão. Sem a mão de obra escrava, a elite se viu obrigada a pagar pelo serviço que antes recebia gratuitamente. Assim, ex-escravos foram aproveitados nas funções do lar e, até hoje, a maior parte desses trabalhadores são afro-descendentes.

Durante muito tempo  a categoria ficou completamente desamparada pelas leis trabalhistas, o que favoreceu diferentes formas de abusos e explorações. Nesse contexto é que surgiram as jornadas de trabalho excessivas e os chamados  "quartinhos de empregada", cubículos  que as profissionais eram obrigadas a  dividir com baratas e trapos dos patrões.

A grande questão é que a elite brasileira nunca engoliu o fato dos mais humildes terem direitos na sociedade, é só a coisa melhorar um pouquinho para o outro lado que já começa a choradeira. O bom é que aos poucos o país está aprendendo a corrigir suas desigualdades, ainda que devagar.

Abaixo, uma performance de Gilberto Gil e Chico Buarque, onde os dois artistas brincam com a música "A mão da limpeza", que denuncia o preconceito e mostra como os negros assumiram atividades domésticas após o fim da escravidão: